«No longo prazo estamos todos mortos» - era esta a resposta de John Maynard Keynes às teorias económicas neoclássicas, onde as políticas de curto prazo serviam para atingir equilíbrios de longo prazo.
Alguém não terá explicado isto ao Presidente da República, Jorge Sampaio, antes de ele apelar ao pacto entre os principais partidos políticos em torno da reforma das finanças públicas - leia-se cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC).
O Orçamento de Estado não um exercício aritmético politicamente neutro. Com a perda das políticas monetária e cambial, a política orçamental é o único instrumento económico que resta hoje ao Governo português para intervir no rumo da economia.
O próprio PEC não é politicamente neutro. O PEC visa a estabilidade do crescimento da inflação na zona Euro, e não o desenvolvimento económico dos países que nela participam. Esta política obsessiva de estabilização da taxa de inflação insere-se na escola neoclássica, monetarista, que não só acredita que a manutenção de uma taxa de inflação baixa cria as condições no longo prazo para o crescimento económico, como considera que o pleno emprego numa economia provoca graves problemas inflacionários (a célebre Curva de Philips). Ou seja, o desemprego será, nesta óptica um mal necessário para garantir, no longo prazo, a estabilidade económica (através do controlo da inflação e das taxas de juro). Teorias económicas já suficientemente desacreditadas desde da década de 80, após as experiências Thatcher e Reagans.
O passado recente, tanto na Europa como em Portugal, veio provar os efeitos negativos que o PEC teve nos diversos países da Zona Euro, ao neutralizar a política orçamental. E tanto a França como a Alemanha continuam a desprezar o limite dos seus défices orçamentais. Não será pois surpreendente que a reformulação do próprio PEC esteja hoje na agenda da Presidência Luxemburguesa da Comissão de Jean-Claude Juncker (o 1º Ministro que não aceitou ser Presidente da Comissão Europeia para que Durão Barroso pudesse ser convidado).
Em Portugal, a política levada a cabo por Manuela Ferreira Leite e Durão Barroso (e que os actuais dirigentes do PSD tentam varrer para debaixo do tapete) revelou-se desastrosa. Na boa linha neoclássica/liberal, foi proposto ao País uma estratégia que crescimento da economia com base nas exportações, desaceleração do consumo (e, preferencialmente, das importações), com um Estado supostamente regulador, preocupado em cumprir, a todo o custo, o limite de 3% do défice orçamental em relação ao PIB. Não havendo qualquer estratégia nacional para o efeito, apostou-se tudo no vermelho - a recuperação da economia alemã, e que o seu efeito de arrastamento chegasse depressa a Portugal. Azar: saiu preto.
O fracasso no controlo orçamental acaba por não ser surpreendente. O crescimento da economia fomentado exclusivamente no dinamismo do sector privado empresarial foi insuficiente, não tendo exercido o Estado qualquer papel na condução da economia nacional (o que andou a fazer o Ministério da Economia nestes últimos anos?). Aliás, o principal corte orçamental foi feito ao nível do investimento público.
O falhanço desta política foi rotundo. O fraco crescimento económico do PIB nacional fez-se, novamente, à custa do consumo privado. As exportações portuguesas não tiveram qualquer impulso. O défice orçamental real é superior a 5% do PIB. A dívida pública já passou os 60% do PIB, outro dos critérios do sacrossanto PEC.
Qual será pois o sentido de propor um pacto de regime à volta da consolidação orçamental, quando o orçamento é o único instrumento económico que permitirá implementar políticas diferentes?
Ou teremos todos percebido mal? Quereria Jorge Sampaio referir-se afinal a um pacto de regime para a reforma e modernização da Administração Pública?