Um homem também chora quando assim tem que ser.
Já me encontrava por terras alentejanas quando subitamente dia 29 fui acordado com a brutal notícia do falecimento do Mário Garcia.
O Mário nada escrevera desde o passado dia 1 de Agosto, e há semanas tinha tomado conhecimento de um eventual agravamento do seu estado de saúde. Contudo não tinha notícias que me permitissem antever este desfecho.
Conheci o Mário nos meus primeiros tempos de militância na JS. Onde, curiosamente, por razões que só quem lá estava nesses anos de 1991/93 pode compreender, era, já aos 20/22 anos, considerado parte do passado. Ele foi o primeiro Coordenador da Concelhia de Lisboa da JS, em 1990/91, logo após a criação das estruturas concelhias. E pouco depois lutava com determinação nos combates liderados por Daniel Adrião contra maiorias de 75-85%.
Tal como eu, o Mário fez parte da Mesa da Comissão Nacional da JS no mandato de 1994-96. E foi aí que começámos a ter alguma proximidade...designadamente nunca mais me esquecerei de uma noite em Caminha em Março de 1995, numa reunião daquele órgão que dura até às 4 da manhã, porque depois de uma discussão extremamente estéril sobre critérios de escolha de candidatos a Deputados (na qual eu bem tratei de meter nojo enunciando as conclusões de uma iniciativa sobre Desporto que organizáramos em Lisboa...hihi) o Mário apresentou uma moção em solidariedade com os trabalhadores da Torralta, a qual foi violentamente combatida designadamente pelo Paulo Penedos, que considerava tal moção esquecer os trabalhadores de outras empresas em dificuldades, designadamente do Norte e Centro do País. Todos votaram em consciência (nem me recordo ao certo se foi aprovada ou não), mas lembro-me de eu e o António Galamba, na altura Presidente da Comissão Nacional, olharmos um para o outro e sermos os únicos a abster-nos.
Ora, a noite não acabou aí. Depois da reunião ainda fomos até uma discoteca, onde eu tentava aliciar o Mário Garcia para a ideia de no Congresso Nacional seguinte se apresentar uma moção anti-moção, na linha do que Júlio Santos fizera no Congresso de 1990, mas aqui com o objectivo claro de após nos chamarem os nomes todos dizermos que o teríamos feito apenas para "estimular o debate" (o que fazia sentido por na altura alguém ter dado uma volta de 180º num qualquer forum afirmando que assumira uma primeira posição apenas com esse objectivo).
Em 1996 voltámos a estar em diferentes projectos, e no Congresso de 1998 o Mário optou por não apoiar qualquer dos projectos. Mas nessa longa noite da Praia da Rocha, enquanto eu tinha a voz em cada vez pior estado (para acabar por discursar rouquíssimo e com mais adrenalina que voz...), de repente a Mesa do Congresso anuncia que apresentaria uma moção sobre Timor. Nos Congressos anteriores vários militantes apresentaram sucessivamente moções sectoriais sobre o futuro de Timor, e já se dizia que
Congresso sem moção sobre Timor não é Congresso. Apanho um pouco mais tarde o Mário cá em baixo e pergunto-lhe suspiciosamente:
Mário, a ideia da moção sobre Timor foi tua, não foi?, ao que ele me respondeu com aquela frase.
Daí que em 2002, quando ele saiu da JS por limite de idade, eu tive a ideia de juntar tudo velha guarda (eu era o mais novo com 27 anos) a elaborar uma moção sobre Timor, também para a despedida do Mário. Mas o Afonso Candal, Presidente do Congresso, levou a ideia mais longe e chamou-o ao palanque para falar sobre isso na sessão de encerramento.
Depois o DESCRÉDITO, projecto que abri em 2003 e ao qual o Mário rapidamente se associou.
Faltam-me as palavras, da mesma forma que faltam e faltarão posts do Mário. Por isso ainda não decidi o que fazer com o DESCRÉDITO. Pelo menos até segunda-feira continuarei por aqui. Não sei se se justifica que este blog mantido em permanência pelo menos a dois continue a existir individualmente com colaborações a espaços dos restantes autores.
NOTA: A fotografia foi adicionada após encontrar o perfil que o Mário mantinha no hi5. Assim talvez alguns dos mais novos que não associam o nome a qualquer imagem certamente se recordarão dele.