Liberdade de educação
O que me admiraria seria ninguém falar do assunto.
A direita liberal-conservadora volta ao ataque. No seu editorial de hoje, José Manuel Fernandes critica que a proposta de Lei de Bases da Educação do Governo não dê maior relevância a esse princípio, admitindo no entanto que não há condições para a implementação de um sistema de vouchers, algo mais conhecido por cheque-ensino.
O que é este sistema já nós conhecemos. O que me deixa verdadeiramente espantado é considerar-se que o sistema actual baseado no Ensino Público e na contribuição de todos para ele não garante a liberdade de educação. Quem o considere esquece-se certamente dos inúmeros estabelecimentos de ensino particular e cooperativo que existem, e que certamente têm procura, caso contrário não sobreviveriam.
O objectivo último deste raciocínio é mais claro que a água da mais pura fonte. É fazer com que a opção pelo ensino particular e cooperativo elimine as obrigações financeiras perante o Estado nessa matéria. Que por pagar o privado, não tem que pagar o público.
Não vou aqui repetir todos os argumentos absolutamente válidos que contra este sistema existem. Embora dê especial relevância à escola onde pessoas bem diferentes se cruzam e conhecem, tornando a vivência de todos cada vez mais rica. Outros certamente preferem ter em casa máquinas de estudar em vez de filhos, e pessoas totalmente imaturas e impreparadas para uma vida adulta. Para asneiras nesse sentido, já chegou a reforma iniciada por Roberto Carneiro.
Preocupam-me hoje sobretudo as consequências ao nível do pensamento e da coisa pública. Se quem usar uma educação privada não quer pagar a pública, e já se adivinha semelhante pensamento para a segurança social, segue-se a saúde, etc. etc. Para além de isto constituir uma manifestação do mais estúpido egoísmo revelador de uma mentalidade selvaticamente ultraliberal, está-se mesmo a ver que isto ainda vai parar em quem defenda o fim dos impostos directos e, consequentemente, da progressividade fiscal. Porque "não tenho que pagar os gastos dos outros".
Essa perfeita ignomínia, se levada à prática, só tem uma consequência. Pobreza. O bem-estar social generalizado da Europa desde o final da II Guerra deve-se fundamentalmente à prioridade desde sempre dada à coesão social por socialistas e democratas-cristãos. Mas esses ultraliberais querem uma selva onde todos estejam absolutamente desprotegidos. Não é por acaso que começam a aparecer os democratas-cristãos de esquerda, tais como Prodi e Rutelli.
É bom que se perceba o fim último onde se quer chegar, que começa sob essa capa da "liberdade de educação". E ter em linha de conta que há que ser rigoroso e relançar a qualidade e a vantagem do ensino público. Pois caso contrário, tal como acontece há 20 anos, continuará a esquerda numa posição meramente defensiva perante os avanços neoliberais.
Essa posição é absolutamente inadmissível. Ser de esquerda exige uma atitude combativa e de resposta aos problemas. Este mundo exige novas soluções, também ao nível da Educação.
E a elas voltarei num próximo post.
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