domingo, janeiro 29, 2006

The Day After - Comunicação Social & Sondagens


No campo da comunicação social, estas eleições presidenciais ficam marcadas por duas novidades:
A ausência de debates durante a campanha eleitoral;
A publicação de um tracking-pool pelo Diário de Notícias.

A novela dos debates, numas eleições com Cavaco como protagonista, era inevitável.
O professor fez-nos o favor de comparecer aos debates que quis, quando quis, e como quis.
Desta forma, houve debates um mês antes das eleições, antes do Natal e do Ano Novo.
Este facto teve influência nos resultados eleitorais?
Sobre este aspecto, apenas se pode verificar que os dois vencedores do ciclo de debates, Louçã e Soares, atingiram nessa altura os melhores scores nas sondagens e acabaram com os resultados que se viu.

O tracking-pool do DN/TSF/Marktest foi também uma marcante novidade.
Este mecanismo estatístico foi publicado diariamente nestes orgãos de comunicação durante os 15 dias de campanha que antecederam as eleições.
Na primeira semana da campanha eleitoral, o tracking-pool da marktest assentou numa amostra de 600 indivíduos, estratificados por quotas. Esta amostra foi sendo renovada diaramente com a realização de 150 novas entrevistas.
Na segunda semana a amostra passou para 1400 indivíduos.
Um tracking-pool não é uma sondagem: serve para tentar observar uma tendência.
Contudo, o DN tratou o tracking pool como se duma sondagem se tratasse, com destaque de 1ª página e citações nos restantes orgãos de comunicação social. Até porque, durante estes 15 dias, nenhuma sondagem foi publicada.
Ricardo Costa avisava que «o tracking poll é um grande método para quem faz uma campanha (partidos, direcções de campanha, centros de estudos eleitorais) mas não sei se o público percebe as nuances de tantas variações». Verificou-se que a própria comunicação social não percebeu estas nuances.
Ou seja, as tendências que 150(!) novas entrevistas podiam revelar, foram lidas como alterações nas intenções de voto.
Graças à disponibilização das fichas técnicas do tracking-pool pela marktest, foi possível detectar fragilidades técnicas do processo de amostragem (aqui, por exemplo).

Até que ponto a publicação de espectaculares alterações diárias contribuiu para a definição de voto dos indecisos?
Pedro Magalhães advertiu no seu Margens de Erro que «poll-driven election coverage squeezes out content that would inform voter's judgment. Poll-driven stories also distort the public's perceptions of the candidates. (...) Candidates are strategists, of course. But the fact that they dramatize their appeals and tailor their messages is nothing new. Such maneuvers are as old as politics itself. What is new is the penetrating intensity with which candidates' activities are exposed, dissected, and criticized

A crescente dependência que os orgãos de comunicação (e os próprios candidatos) vão mostrando em relação às sondagens obriga a que, no futuro, haja um maior profissionalismo no tratamento destas questões.

(A marginalização de que Garcia Pereira foi vítima por parte dos media, em especial quanto à sua participação nos debates, não foi, infelizmente, uma novidade.)

5 Comentários:

Às 30 janeiro, 2006 01:30 , Blogger Andrew Moke disse...

Garcia,

O objectivo do post não é esse e ainda para mais já debatemos isto noutro lado. Mas, e depois de acompanhar as vossas discussões e as explicações "técnicas" do margem de erro, continuo com certas dúvidas em relação a esse tal método do tracking-pool.

Serve exactamente para quê? A explicação da tendência, do ponto de vista estatistico, não me parece muito válida. Ou a amostra é representativa da população ou não o é. Amostras não representativas, não produzem estatisticas válidas. Do ponto de vista técnico, roça o absurdo irmos adicionando individuos a determinada amostra, sobretudo sabendo que esses individuos podem introduzir desvios substanciais nas minhas conclusões finais. Suponha que os tais primeiros 600 são da freguesia de, por exemplo, Beja. Jerónimo vence, Cavaco esmagado. A segunda "leva", vem de Viseu. O que acontece à minha amostra? Fica histérica. Apenas um exemplo por redução ao absurdo, obviamente. As coisas não são feitas desta forma.

Mas como falar em tendência se não dispomos de um padrão constante de análise?

 
Às 30 janeiro, 2006 02:55 , Blogger Mario Garcia disse...

Caro Andrew Moke,

Está a tocar no ponto fundamental.
Uma tracking-pool tem um significado muito restrito.
À partida, a amostra tipo está bem identificada, é representativa do universo, ou de uma parte dele (se o estudo estiver a ser feito sobre nichos).
E serve para poder detectar uma tendência que permita manter, corrigir ou melhorar uma determinada estratégia.
A renovação de parte da amostra permite, por outro lado, corrigir enviesamentos da tendência.

Ou seja, um tracking-pool serve para saber, por exemplo, que Cavaco Silva está a descer.
O problema é qd se tranforma este tipo de informação, num dado quantitativo. Como dizer, com base em 150 entrevistas, Cavaco Silva desceu de ontem para hoje 3%.

Foi isto q o DN fez durante 15 dias.

(Sem entrarmos na tal discussão da representatividade da amostra face ao universo, e na sua alteração, com os estranhos padrões de correlação face aos resultados q foram apontados.)

 
Às 30 janeiro, 2006 10:29 , Blogger Elisiário Figueiredo disse...

Penso que este método foi importado dos stafs de algumas campanhas eleitorais anteriores, nomeadamente o PS e PSD, eram utilizados para acompanhar as tendencias do eleitorado.

 
Às 30 janeiro, 2006 11:48 , Blogger Tonibler disse...

Moke,

A marketest tinha um sistema de amostragem por quotas, x mulheres, y homens, z mistos,....


Garcia,

O facto do tracking ter ido à viola logo nos primeiros dia, não quer dizer que se tivesse perdido a pool. Tanto que a pool acertou, embora o tracking não fizesse sentido nenhum. Aliás, no dia seguinte a termos discutido isto aqui, a marktest passou para 350 as renovações, mas a tracking nunca fez sentido.

O bocado de texto que mostra refere-se a qualquer sondagem, do tipo que fôr. Mesmo as do tipo Eurosondagem, feitas aleatoriamente nos comícios do Soares.

Aquilo que se observou, e estes são os facto indesmentíveis, é que todas as empresas de sondagens, excluindo uma, estiveram próximas do resultado final. E é essa uma que está sob suspeita desde a 2ª publicação.

Aquilo que o Ricardo Costa diz é um bocado estúpido, porque a pool está lá independentemente de dar tracking ou não. O público entende mal, mas os jornalistas não entendem mesmo nada!

 
Às 30 janeiro, 2006 12:46 , Blogger Mario Garcia disse...

Elisário,

Os staffs partidários fazem tracking-pools exactamente para verificar tendêcias, e depois fazem sondagens.

Saber se o discurdo do líder X está a resultar junto dos eleitores das classes B/C, entre os 30 e os 50, pode ser feito com uma tracking-pool.

 

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