quinta-feira, dezembro 15, 2005

A «Sociedade Civil»


Há algum tempo, houve alguém que se lembrou de reinventar um estranho conceito:

A «Sociedade Civil»

Esta «Sociedade Civil» é constituída, supostamente, por uma maioria silenciosa de cidadãos a que é negado o exercício da sua cidadania pela opressão e tirania dos partidos políticos, também denominados de aparelhos partidários.



O conceito de «Sociedade Civil» existe apenas para menosprezar a actividade política.
Existe para estabelecer uma relação dialética, binária.
À pureza e inocência da «Sociedade Civil» contrapõem-se a vilanagem da política e dos políticos.
Ao valor e sabedoria da «Sociedade Civil» temos a entropia imbecil do clientelismo partidário.

Foi por causa da «Sociedade Civil» que se criaram e convocaram os Referendos sobre a interrupção da IVG e sobre a Regionalização, e que se tornou possível a todos os cidadãos «independentes» candidatarem-se a orgãos locais.
Foi em nome desta «Sociedade Civil», cujos porta-vozes, paradoxalmente, foram, sempre, dirigentes políticos, que se criticou na última década a política, os políticos, os partidos políticos, os representantes políticos, em resumo, tudo o que acenasse a política.
Foi em nome desta «Sociedade Civil» carente que se realizaram os sucessivos Estados Gerais e que se proclamou o «no job for the boys». Que se quiseram transformar em proscritos parasitários os militantes dos partidos, incompetentes e acéfalos pelo simples acto de filiação.

Curiosamente, esta «Sociedade Civil» continua silenciosa.
Se apareceu nos Referendos, foi atrás de movimentos liderados por partidos políticos.
Se apareceu nas Eleições Autárquicas, salvo raríssimas excepções, foi para encobrir secessões partidárias.
Ou seja, este conceito de «Sociedade Civil» é uma falácia.
Mas uma conveniente falácia.

Conveniente para uma maioria silenciosa, egoísta, despreocupada com a gestão do bem comum.
Conveniente para aqueles que, não tendo singrado na vida pública, política, fazem do seu modo de vida a crítica aos políticos enlaivecida de uma superioridade intelectual que lhes normalmente conferida pela a ausência do contraditório.
Conveniente para todos aqueles que querem destruir a Democracia.

Porque a Democracia, por definição, não se faz sem partidos políticos ou contra os partidos políticos.
E se, porventura, o nível médio da nossa classe política não é o ideal, ou sequer o aconselhável, é também porque há uma lacuna generalizada no exercício dos deveres de cidadania.
A cidadania não se exerce ostentando opiniões instantâneas sobre o aeroporto da Ota, o TGV ou o Défice.
A cidadania não se esgota no exercício no direito (dever) de voto.
A cidadania é a consciência das consequências de se viver numa sociedade livre.

Numa verdadeira Democracia, seria natural que os cidadãos participassem activamente na política, junto das organizações com que melhor se identificassem quanto ao seu ideário, propondo, debatendo, discutindo as melhores soluções para os problemas do bairro ou do País.
É para isso que servem os partidos políticos.
Seria isto uma Democracia participativa.

Mas daria muito mais trabalho.
Muito mais fácil e divertido é criticar e insultar à volta de um prato de tremoços.
Esta criatividade é a única característica construtiva da tal «Sociedade Civil».
Só que, um dia destes, apenas haverá «Sociedade Civil».

(E os militares, claro.)

2 Comentários:

Às 15 dezembro, 2005 19:11 , Anonymous Anónimo disse...

Estás inspirado hoje. EXCELENTE !!!

 
Às 16 dezembro, 2005 11:48 , Blogger Tonibler disse...

Esta merece uma resposta no Tonibler...

 

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