quarta-feira, janeiro 28, 2004

Ainda o Papel do Estado na Economia

Na continuação deste nosso pequeno debate com o The Bulls and The Bears acerca do Papel do Estado na Economia, começo por assinalar que estamos de acordo em relação às nossas divergências de fundo, onde aparece claro que a distinção Esquerda / Direita continua a fazer todo o sentido (bem hajas Norbeto Bobbio).

Contudo, existem 4 pontos sobres os quais não posso deixar de tecer comentários.

1 – Ainda a Curva de Phillips

Comparar directamente dados de 1996 com 2001 traduz-se numa recta, e não numa curva.
Tendo como base os valores do Eurostat para a inflação em Portugal (Índice de Preços no Consumidor – IPC) e para a taxa de desemprego, temos a seguinte situação:

-------Ano 1996---1997---1998--1999---2000--2001---2002
--------IPC 2,88% 1,90% 2,26% 2,11% 2,82% 4,39% 3,68%
Tx Desemp 7,20% 6,30% 4,80% 4,10% 3,80% 4,20% 6,20%

Ou seja, o efeito da Curva de Phillips só é observável em 2002. Entre 1996 e 2001 a inflação permanece estável, não acompanhando inversamente a descida da taxa de desemprego. Mesmo em 2002, ambas as taxas sobem. Porquê?
A subida da inflação em 2001 é muitas vezes apontada como consequência da introdução do Euro, e da adaptação dos preços. Em 2002, já mudámos claramente de Governo, e o PEC é Lei.
Talvez a Curva de Phillips só seja aplicável quando a inflação é um objectivo e não um instrumento.

2 – O Efeito Euro 2004

Concordo que em Lisboa, o efeito Expo98 foi maior que o possível efeito Euro 2004.
Mas este último terá impacto em várias zonas do País.
Numa primeira fase ao nível da construção dos Estádios, depois ao nível do turismo (por isso, lá estivemos a torcer pela qualificação da Espanha...).
O uso futuro dos novos Estádios será provavelmente um bom desafio para a iniciativa privada, uma vez que nem só de futebol vive o homem...

3 – O Efeito do Multiplicador Keynesiano

Este ponto permite integrar várias questões, que acabam por reflectir a posição dos economistas neo-liberais que se recusam a admitir a existência de um importante efeito multiplicador do Investimento e Consumo Públicos.
Isto aplica-se quer aos «efeitos Euro2004/Expo98», como ao aumento do poder de compra da Função Pública.

A teoria do Multiplicador Keynesiano defende a existência económica de um efeito de retorno superior ao investimento/consumo realizado pelo Estado. Ou seja, ao aumentar o poder de compra real dos Funcionários Públicos, existe um aumento da procura de bens e serviços. Que por sua vez se reflecte nas empresas fornecedoras dos mesmos, nos ordenados dos seus funcionários, e por aí fora.
A Direita, que advoga uma intervenção minimalista do Estado, defende que a dinamização da Economia é da responsabilidade do sector empresarial privado (que porém, não resiste à tentação dos subsídios).

Mas há algo que falha «The Bulll» na sua argumentação. Para onde foram os 156,6 milhões de Euros? Eu julgava que só podiam ser Consumo ou Poupança. Será que, pura e simplesmente, desapareceram? (ou estão debaixo dos colchões dos Funcionários Públicos).
Se não se verificou um aumento do Investimento Privado, talvez seja interessante analisar a situação do sector bancário português, e do seu grau de individamento com o exterior. E falamos de bancos privados...

4 – O PEC

E isto leva-nos direitinhos ao PEC.
Concordo plenamente com a análise técnica que faz sobre o PEC.
Mas o PEC tem um pecado de concepção, na altura motivado por as correntes monetaristas estarem na moda: está completamente centrado na estabilidade da taxa de inflação, e privilegia a convergência nominal em detrimento da convergência real das economias.

Tenho também dúvidas na aplicação dos efeitos propostos por alguma teoria económica à situação de Portugal, ou seja, um País pequeno, integrado numa União Económica e Monetária.
O défice orçamental é, de facto, o único instrumento autónomo com que um Governo pode hoje intervir na Economia. Daí a importância do seu uso de uma forma contra-cíclica (admitindo, claro está, a validade do Multiplicador Keynesiano), em particular nas recessões económicas.

Em Portugal, o zelo com que se encarou o cumprimento nominal do Défice Público é já claramente considerado um erro de política económica, que se pretende prosseguir à custa da venda de activos e truques de maquilhagem orçamental.
Um erro porque, acima de tudo, a política orçamental contraccionista agravou a tendência económica recessiva importada da Europa (de importância assinalável, devido ao nosso elevado grau de abertura intra-europeio do comércio externo).
Esta obsessão, acumulou-se a outros erros de palmatória, como a desastrosa política fiscal do aumento do IVA, um imposto directo, que levou ao «crowding-out» nas receitas fiscais decorrente da contracção do consumo (bem visível no apuramento final das receitas fiscais), ou mesmo dos famosos «discursos da tanga», e os seus efeitos nas expectativas dos agentes económicos.

Mesmo o argumento diplomático de obedecer aos Tratados, deixa de fazer qualquer sentido no plano teórico, a partir do momento em que a França e a Alemanha liquidam o PEC.
Portugal é hoje considerado «O Pato do PEC».

Fica inevitavelmente a pergunta, Senhores da Direita, quem beneficiou com tudo isto?



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