terça-feira, janeiro 27, 2004

O Papel do Estado na Economia, Enfim...

O Papel do Estado na Economia é talvez, desde sempre, um dos mais fascinantes temas de debate entre Economistas. O mesmo tem acontecido entre os políticos.

A argumentação que junta economia e política é sempre um terreno muito escorregadio e perigoso.
Especialmente, a utilização de questões técnicas para justificar razões políticas, é por vezes bastante ardilosa.

Mas é, contudo, inevitável.

No blog The Bull and The Bear, as considerações feitas acerca do Papel do Estado na Economia levou a que o Pedro Sá comentasse que «a direita liberal defende explicitamente as pessoas ao serviço da economia».
O mesmo blog exerceu o direito de resposta.

Em primeiro lugar, há que reconhecer que o Pedro Sá se excedeu.
A direita liberal defende implicitamente (e não explicitamente) as pessoas ao serviço da economia.
O que é normal, porque a direita defende sempre os seus interesses implicitamente.

Pressupostos Neo-Clássicos
A posição escrita no blog em causa, faz uma descrição de alguns malefícios de uma política económica de esquerda ao serviço do Estado (deverá haver mais, concerteza).
Para além de discordar tecnicamente com o texto, fico com dúvidas sobre alguma informação dada como adquirida.

Sendo fastidioso e provavelmente desinteressante criticar ponto a ponto esta posição, proponho a análise inversa.
Os economistas de direita, herdeiros das teses neoclássicas, acreditam entre outras coisas que:
Existem mercados perfeitos (ou quase perfeitos) – a «mão invisível»
O desemprego é um custo social para o crescimento económico
Desenvolvimento económico significa crescimento económico
A inflação é um objectivo e não um instrumento
Os equilíbrios económicos atingem-se no longo prazo (o que provocou o célebre comentário de Keynes
de que «no longo prazo, estamos todos mortos»)
Um Estado fraco pode exercer um papel forte na regulação económica
Eficiência significa eficácia e melhor serviço prestado
Pleno emprego significa inflação (acreditam na Curva de Phillips)

A Curva de Phillips
Discordando tecnicamente de todos estes pressupostos, gostaria de analisar apenas este último, por me parecer mais interessante no âmbito desta discussão
A célebre Curva de Phillips surge duma constatação empírica na Inglaterra dos anos 50 duma relação inversa entre inflação e emprego. Esta relação tem vindo a ser sucessivamente confirmada e contestada nos últimos 50 anos.

No caso português, o Governo Socialista oferece uma excelente amostra empírica, uma vez que houve permanentemente um crescimento do emprego e uma diminuição da inflação, ao ponto de termos tido as condições nominais de entrada no Euro, e de termos alcançado o Pleno Emprego técnico (verificando-se apenas o chamado desemprego friccional).

Por maior que seja o desfasamento da correlação que pretendemos utilizar (por exemplo, o utilizado por este Governo, em que a culpa de tudo o que acontece ainda é fruto das políticas do Governo anterior), a Curva de Phillips não parece ser uma teoria económica aplicável nesta situação.

Privatizações
Também em termos empíricos, o Thatcherismo dos anos 80, é outro excelente caso para estudo sobre privatizações de serviços públicos. Por exemplo, os correios britânicos, ou os comboios, eram um modelo mundial de serviço prestado. O «fazer melhor» dos privados, aumentou a eficiência das empresas. Mas eficiência não é eficácia, e a optimização destas empresas representou perdas para o consumidor.

O peso do Estado na Economia passa pela análise do que são os chamados «bens públicos».
À esquerda, acredita-se que o Estado deve intervir no fornecimento de bens e serviços que se enquadram neste conceito, pois é a forma de garantir a sua existência e fornecimento a preços normalmente inferiores aos seus custos de produção.
A direita, pelo que aprendeu, e pelo o que se tem visto, acredita agora que o sector privado continua a ser mais eficaz nestes serviços, desde que adequadamente pago e ressarcido pelo Estado dos custos.
Ou seja, aquele mito de que uma gestão privada de uma empresa pública que desse prejuízo, a tornaria automaticamente lucrativa, deixou de existir, até para a própria direita. E a comprová-lo temos o facto de, até hoje, a política de privatizações em Portugal tem abrangido apenas empresas verdadeiramente lucrativas do sector público empresarial.

Também a política Bagão Félix ao nível da destruição do Sistema de Segurança Social é mais um caso descarado de como a direita acredita que os interesses privados são essenciais para o crescimento económico do País. É porém pelo menos curiosa a notícia de ontem do Semanário Económico que revela que a gestão de fundos feita pela Segurança Social (sim! Porque a Segurança Social continua a ser superavitária), tem apresentado uma rentabilidade muito superior à gestão de fundos privados.
É a tal «mão invisível» a funcionar...


Notas Finais
Há ainda muitas questões que poderíamos discutir.
Por exemplo, pergunta «The Bear» qual a produtividade que o aumento de 156,5 milhões de euros do Governo Socialista em remunerações permanentes. A resposta é muito simples: 156,5 milhões de euros para funcionários distribuírem entre poupança e consumo. No caso da poupança, acréscimo da taxa de poupança, essencial para a concessão de crédito ao Investimento privado. E no caso do consumo, para aumentarem a procura de bens das empresas privadas.

E, já que fala na importância do «Efeito da Expo98», não há também um impacto do «Euro 2004»?

E quem explica a coerência da política económica dos EUA (governo de direita, aumento do défice, investimento público, inflação...)?

Não lhe pergunto quais os efeitos que a política económica e monetária levada a cabo nos últimos dois anos, fortemente contracionista, tiveram sobre a produtividade da economia portuguesa, porque os resultados estão bem à vista. E se tiver dúvidas, é ver as políticas e os resultados da França e da Alemanha, ou perguntar a opinião de Miguel Cadilhe.

Finalmente, concordo em que existem virtudes e defeitos nas políticas ditas de esquerda e de direita.
Mas existe uma diferença clara entre ambas.
A esquerda privilegia o desenvolvimento económico em detrimento do crescimento económico.
A esquerda não aceita que o desemprego e os cortes nas políticas de apoio social, sejam um preço aceitável para «purificar» o tecido económico
.

E o Pacto de Estabilidade e Crescimento deveria estar centrado na estabilidade e no crescimento económico, e não com a estabilidade e o crescimento da inflação. Neste caso, é de ler Joseph Stiglitz e o seu ataque ao Banco Mundial e ao FMI, na forma como arruinaram algumas economias mundiais por apenas se preocuparem com a inflação e agregados monetários relacionados.

Mas bem pior de criticar uma política de esquerda ou de direita, é tentar criticar a política de Manuela Ferreira Leite, que ao nível da Economia Pública não tem qualquer enquadramento teórico.
Talvez tenha uma «mãozinha» ao nível da economia privada...

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