sexta-feira, julho 23, 2004

Eu, Ex-Sampaísta, Me Confesso

Quando Mário Soares foi eleito Presidente da República em 1986, numa 2ª volta contra Freitas do Amaral que dividiu ao meio o País, Soares fez questão de entregar o seu cartão de militante ao PS como forma simbólica de reafirmar que iria ser «Presidente de todos os portugueses», mesmo sendo «Socialista, Republicano e Laico».

Quando em 1996 Jorge Sampaio foi eleito Presidente da República contra Cavaco Silva, Sampaio, ao contrário do seu antecessor, quis manter o seu cartão de militante do PS. Foi a sua forma simbólica de dizer que, apesar do cargo que ocupava, não deixava de ser a pessoa que era, com o seu percurso político e os seus valores e princípios.

Faço esta analogia quando já tudo foi escrito e dito sobre a decisão de Jorge Sampaio em não marcar eleições antecipadas e aceitar Santana Lopes como 1º Ministro.

Isto porque julgo que, friamente, há que distinguir as críticas dirigidas ao cidadão Jorge Sampaio, daquelas feitas ao Presidente Jorge Sampaio.

O Presidente da República Jorge Sampaio tomou uma decisão que está em conformidade com a Constituição da República. Ninguém o desrespeitou, ninguém o acusou de qualquer ilegalidade, inconformidade (ou «golpe de estado»).

O problema é que o cidadão Jorge Sampaio tomou uma decisão que trai todo o seu passado político, acervo fundamental que conduziu a que a maioria dos portugueses, em especial de esquerda, o elegessem duas vezes para o mais elevado cargo político da Nação.

A reacção emotiva de Ana Gomes à sua decisão fez eco da perplexidade e indignação de milhares de outros cidadãos, que viram o Jorge Sampaio que julgavam conhecer, explicar à Nação que a estabilidade económica é mais importante que a transparência democrática.

A voracidade com que a Direita dos interesses está a abocanhar esta oportunidade, distribuindo as pastas governamentais como se tratasse da divisão de um saque entre uma horda de bárbaros, talvez traga novamente uma lágrima ao Presidente Sampaio.

Considero-me hoje ex-Sampaísta, porque os valores em que acredito e defendo deixaram de ter Sampaio como uma referência.

Sampaio pode continuar a ter o seu cartão de militante do PS como uma boa recordação do seu passado político.


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